A reforma tributária sobre o consumo é uma realidade inadiável no ambiente empresarial brasileiro. A partir de janeiro de 2026, o modelo de tributação sofrerá alterações estruturais que transcendem a simples substituição de tributos ou a definição de novo fato gerador para bens e serviços. Trata-se de uma transformação estratégica que alcança diretamente a formação de preços, a estrutura de custos e a governança operacional das empresas — com especial impacto sobre os prestadores de serviços intelectuais, como escritórios de contabilidade, advocacia, arquitetura, consultorias financeiras, agências de comunicação e demais profissionais liberais.
Em um contexto em que manter a operação já é um desafio cotidiano, será indispensável recalibrar a política de precificação, incorporando de forma planejada a nova carga tributária decorrente da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).
Importante destacar que os optantes do Simples Nacional também serão afetados. A Lei Complementar nº 214/2025 introduz dois mecanismos inéditos: (i) a possibilidade de comercialização de créditos de IBS/CBS; e (ii) o split payment, sistema em que o imposto é retido e transferido diretamente ao fisco, sendo creditado ao prestador apenas o valor líquido. Já os regimes de Lucro Presumido e Lucro Real enfrentarão elevação de obrigações acessórias e maior rigor fiscal, impondo padrões mais elevados de compliance e governança.
A tendência é que o novo modelo atue como catalisador de migrações de regime, tornando certas faixas do Simples menos vantajosas. Modelos híbridos, por sua vez, devem permanecer restritos, dada sua complexidade operacional.
Sem o devido planejamento, profissionais podem absorver inadvertidamente a nova carga tributária, comprometendo margens de rentabilidade. Hoje, escritórios enquadrados no Lucro Presumido enfrentam alíquotas nominais entre 5,65% e 8,65%, sem direito a créditos; no Lucro Real, variam entre 11,65% e 14,65%, com aproveitamento restrito de créditos. Despesas com aluguel, internet, impressoras, limpeza ou terceirizações gerarão crédito de entrada, mas o impacto financeiro será limitado diante da elevação global da alíquota.
O impacto da reforma, contudo, ultrapassa a seara tributária. A profissionalização da gestão, com fortalecimento da governança corporativa, automação de controles internos, integração de dados e participação ativa da alta administração, será determinante para a sustentabilidade financeira. A simples repactuação de preços ou parametrização de sistemas não será suficiente: sem estrutura estratégica e capacidade de análise, diversos escritórios poderão enfrentar erosão de margem ou inviabilidade operacional até 2033.
Em consequência, a precificação estratégica deverá ser continuamente revisada. O que é viável em determinado período ou segmento pode não se sustentar em outro. A nova alíquota, superior às incidências atuais de ISS e ICMS, exige planejamento tributário dinâmico, simulações de cenários, revisão de políticas comerciais e monitoramento rigoroso de despesas e margens.
A transparência na precificação torna-se elemento central, já que clientes acompanharão com atenção a composição de preços e os tributos destacados em notas fiscais. Entre 2026 e 2033, espera-se que as empresas aprimorem seus controles contábeis, adotem soluções de governança e revisem práticas gerenciais para absorver o novo sistema. Aqueles que investirem em tecnologia, processos padronizados e capacitação de equipes enfrentarão a transição com impacto reduzido.
Em síntese, a reforma tributária do consumo não se limita à substituição de tributos, mas representa uma reconfiguração estrutural na precificação, na gestão financeira e na sustentabilidade dos serviços profissionais. Planejamento tributário, governança e tecnologia deixam de ser diferenciais competitivos para se tornarem condições de sobrevivência empresarial.