O vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Luis Felipe Salomão, admitiu o processamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão da Corte Especial que, por maioria, fixou a taxa Selic como índice aplicável à atualização das dívidas de natureza civil. Com a decisão, a controvérsia será submetida à apreciação do Supremo Tribunal Federal (STF).
O julgamento na Corte Especial foi concluído em agosto de 2024, ocasião em que prevaleceu o voto do ministro Raul Araújo. Naquele entendimento, o artigo 406 do Código Civil de 2002 deve ser interpretado em consonância com o regime jurídico da taxa Selic, a qual incorpora, de forma unificada, os juros moratórios e a correção monetária – sendo, por isso, considerada a taxa legal para os débitos civis, nos moldes do que se aplica aos débitos tributários com a Fazenda Nacional.
A Corte também afastou a incidência da taxa de juros prevista no artigo 161, § 1º, do Código Tributário Nacional (CTN), por entender que sua aplicação restringe-se ao inadimplemento de obrigações tributárias, não se estendendo ao âmbito das obrigações civis.
Ao admitir o recurso, o ministro Salomão destacou que os argumentos apresentados pela parte recorrente, alinhados aos votos vencidos no julgamento colegiado, revelam plausibilidade jurídica quanto à tese de que a utilização da Selic para fins de correção de dívidas civis – sobretudo quando calculada pela soma dos percentuais mensais acumulados ou pela multiplicação dos fatores diários – pode comprometer a recomposição integral do valor do crédito, em violação ao princípio constitucional da reparação integral do dano.
O ministro observou, ainda, que o STF tem precedentes reconhecendo a legitimidade da Selic para correção de débitos tributários e na Justiça do Trabalho em substituição à Taxa Referencial (TR). No entanto, ponderou que tais decisões foram proferidas no contexto do direito público, diferindo, portanto, da matéria ora discutida, que se insere no domínio do direito privado, o que caracteriza hipótese de distinguishing.
Salomão também advertiu para a possibilidade de que, em períodos extensos, a metodologia de soma dos acumulados mensais da Selic resulte em atualização insuficiente frente à inflação real, o que conflita com a jurisprudência do STF segundo a qual a correção monetária visa preservar o valor da moeda, sendo esta intrinsecamente vinculada à inflação.
Diante do prequestionamento dos artigos 1º, inciso III, e 5º, incisos V e X, da Constituição Federal, e da ausência de enfrentamento específico pelo STF sobre os efeitos da metodologia de cálculo da Selic na seara das dívidas civis, o vice-presidente do STJ concluiu pela admissibilidade do recurso extraordinário quanto ao ponto.
Fonte: STJ