A controvérsia em análise reside na necessidade de autorização específica da assembleia geral de credores ou do reconhecimento expresso pelo juízo da conveniência da alienação de ativos de sociedade empresária em recuperação judicial, quando tal alienação já está prevista no plano devidamente homologado.
Inicialmente, cumpre destacar que o ajuizamento do pedido de recuperação judicial impõe restrições ao patrimônio da empresa recuperanda, que, a partir desse momento, fica impedida de alienar ou onerar livremente bens e direitos de seu ativo não circulante. A realização de tais atos somente é permitida mediante autorização judicial, após manifestação do comitê de credores ou, na ausência deste, do administrador judicial, cabendo ao magistrado avaliar se a medida contribui ou prejudica a viabilidade da recuperação empresarial.
No entanto, quando a alienação ou oneração do bem estiver expressamente contemplada no plano de recuperação judicial homologado, inexiste a necessidade de nova autorização judicial ou de manifestação dos credores, visto que a deliberação já foi realizada no âmbito do plano aprovado.
No caso concreto, a alienação do imóvel estava expressamente prevista no plano de recuperação homologado, com a devida justificativa quanto à destinação dos recursos obtidos, os quais seriam utilizados para reforço do fluxo de caixa, quitação de passivos originalmente contraídos pela recuperanda e por empresas do mesmo grupo econômico, bem como pagamento de credores trabalhistas, financeiros e operacionais. Ademais, não se questionou o valor da transação, a boa-fé do adquirente ou a existência de qualquer prejuízo à recuperanda ou indício de fraude.
Nessa perspectiva, nos termos do artigo 60, parágrafo único, da Lei nº 11.101/2005, os bens alienados no âmbito do processo de recuperação judicial são transferidos livres de ônus e sem sucessão do adquirente nas obrigações do devedor, conferindo maior segurança jurídica ao investidor interessado na aquisição de ativos de empresas em crise. Esse entendimento é aplicável tanto às alienações judiciais quanto às demais modalidades de venda (REsp 1.854.493/SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 23/8/2022, DJe 26/8/2022).
Dessa forma, uma vez consumada a alienação, com o devido recebimento dos valores pela empresa devedora e o registro da escritura pública de compra e venda, impõe-se a manutenção do negócio jurídico, resguardando a segurança jurídica e a boa-fé do terceiro adquirente.
Ademais, o posterior encerramento da recuperação judicial, decorrente da perda superveniente de objeto no que tange à preservação da atividade econômica da recuperanda, reforça a impropriedade de eventual declaração de ineficácia da alienação. Tal medida não beneficiaria a empresa recuperanda e, ao contrário, causaria grave prejuízo ao adquirente, que, em caso de desfazimento do negócio, passaria à condição de credor da massa falida, com reduzidas perspectivas de reaver integralmente o montante desembolsado pela aquisição do imóvel.
Fonte: STJ