A apresentação de reclamação concomitante com a interposição de recurso contra sentença não impede o conhecimento da reclamação, não levando à sua extinção sem resolução de mérito.
O entendimento é da ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça, que determinou que o Grupo Especial da Seção de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo aprecie uma reclamação na disputa pela Eldorado Celulose.
O caso envolve reclamação da J&F contra sentenças da 2ª Vara Empresarial e de Conflitos Relacionados à Arbitragem, que deu decisões durante o perído em que estava vigente ordem do TJ-SP para suspender os processos relacionados à venda da Eldorado Celulose para a Paper Excellence.
A J&F apresentou reclamação, afirmando que houve desrespeito à decisão do TJ-SP determinando a suspensão, mas também entrou com recurso na corte, simultaneamente.
O Grupo Especial da Seção de Direito Privado do TJ-SP rejeitou a reclamação com o argumento de que ela não era cabível diante da interposição concomitante do recurso.
Para Nancy, no entanto, o que impede o cabimento da reclamação não é a interposição de recurso contra a decisão reclamada, mas o trânsito em julgado dessa decisão.
A ministra citou a Súmula 734 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual “não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal”.
“A reclamação é cabível mesmo quando apresentada em face de decisão impugnada pelo recurso cabível. Inclusive, conforme o §6º do art. 988 do CPC, acima transcrito, eventual recurso interposto contra a decisão reclamada não prejudica a reclamação mesmo quando já julgado”, disse a ministra do STJ.
Nancy também afirmou que, enquanto o julgamento da reclamação cabia ao Grupo Especial da Seção de Direito Privado do TJ-SP, o julgamento da apelação cabia a uma das turmas de Direito Privado do tribunal paulista.
“Logo, também se afasta a alegação de tentativa de utilização de reclamação como sucedâneo recursal, já que as competências para os julgamentos da apelação e da reclamação pertencem a órgãos jurisdicionais distintos.”
A ministra, no entanto, rejeitou pedido para cassar, de forma definitiva, a sentença de primeira instância que autorizou a transferência das ações da Eldorado Celulose à Paper Excellence, obrigando apenas a análise da reclamação pelo TJ-SP.
A disputa entre a J&F e a Paper Excellence é uma das maiores do país e se arrasta desde 2017. A empresa brasileira vendeu 49,41% da Eldorado para a Paper Excellence em 2017, por R$ 3,8 bilhões. O contrato incluía a opção de compra da empresa toda, por R$ 15 bilhões, válida por um ano. E a multinacional só poderia adquirir o restante das ações, 50,59%, depois de assumir as dívidas da empresa.
Esgotado o prazo, a Paper não havia liberado as garantias (ativos da J&F que lastreavam os empréstimos feitos para a estruturação da Eldorado).
Pouco antes, sem perspectiva de conseguir o dinheiro para a operação, a Paper entrou na Justiça para pedir o controle imediato da Eldorado e prazo indeterminado para quitar a compra. O juiz do caso, então, percebendo a artimanha nada ortodoxa, negou os pedidos da Paper.
Em março de 2021, o TJ-SP suspendeu a transferência da Eldorado para a Paper Excellence. Mesmo com a suspensão, a juíza da 2ª Vara Empresarial e de Conflitos Relacionados à Arbitragem analisou o médico do caso e manteve a arbitragem que transferiu a empresa.
A J&F apresentou reclamação contra a decisão, afirmando que houve violação à ordem de suspensão do TJ-SP, mas o pedido não foi analisado, sob o argumento de que também havia apelação da empresa.
REsp 2.122.969
Fonte: Conjur