A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento no sentido de que a concessão de penhora em execução fiscal não pode ser condicionada à comprovação de que tal medida não compromete a recuperação judicial da empresa executada. Dessa forma, conferiu provimento ao recurso especial interposto pela Fazenda Nacional, permitindo a penhora de bens pertencentes a uma empresa do setor cerâmico, objeto de cobrança por dívida tributária.
O precedente reveste-se de ineditismo no âmbito das turmas de Direito Público do STJ, pois aplica as disposições introduzidas pela Lei n.º 14.112/2020, que reformulou dispositivos da Lei n.º 11.101/2005, visando pacificar conflitos entre execuções fiscais e processos de recuperação judicial. Especificamente, o § 7º-B do artigo 6º da referida legislação estabelece que a decisão sobre a penhora compete exclusivamente ao juízo da execução fiscal, cabendo ao juízo da recuperação judicial, no máximo, substituir a constrição sobre bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial.
No caso concreto, o juízo da execução fiscal indeferiu o pedido de penhora formulado pela Fazenda Nacional, sob o argumento de que os bens indicados estavam qualificados como essenciais no plano de recuperação judicial da empresa. Em razão disso, entendeu que a Fazenda não demonstrou que a constrição não comprometeria o soerguimento da devedora.
O Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por sua vez, reconheceu que a legislação vigente não impede a expedição de mandado de penhora dos bens indicados pela Fazenda, mas manteve a decisão de indeferimento, em razão da dificuldade da exequente em identificar os bens essenciais ao funcionamento da empresa recuperanda.
No julgamento do recurso especial, o ministro Marco Aurélio Bellizze ressaltou que a edição da Lei n.º 14.112/2020 afastou a interpretação até então prevalente, segundo a qual a penhora de bens de empresa em recuperação judicial dependeria da sua essencialidade para a continuidade das operações empresariais. Destacou ainda que, no âmbito da execução fiscal, compete ao juízo da recuperação judicial apenas determinar a substituição dos atos de constrição que recaiam exclusivamente sobre bens de capital essenciais, enquanto perdurar o processo recuperacional.
Dessa forma, a Segunda Turma do STJ decidiu, por unanimidade, permitir a penhora solicitada pela Fazenda Nacional, determinando que o juízo da recuperação judicial fosse cientificado da decisão para que pudesse avaliar eventual necessidade de substituição dos bens constritos.
Tal decisão alinha-se à jurisprudência já firmada pela Segunda Seção do STJ, órgão responsável pelos temas de Direito Privado, que, em maio de 2024, reafirmou a competência do juízo da execução fiscal para determinar o bloqueio de valores pertencentes a empresas em recuperação judicial.
Ademais, a Corte estabeleceu que os “bens de capital” referidos no artigo 6º, § 7º-B, da Lei n.º 11.101/2005 devem ser compreendidos como bens corpóreos, móveis ou imóveis, não perecíveis ou consumíveis, utilizados no processo produtivo da empresa.
Importa ressaltar que, até a vigência da Lei n.º 14.112/2020, a jurisprudência das turmas de Direito Público do STJ condicionava a penhora à inércia da empresa recuperanda em adotar providências para suspender a exigibilidade do crédito tributário, enquanto a Segunda Seção atribuía ao juízo da recuperação judicial a competência para decidir sobre a possibilidade da penhora.
O tema chegou a ser afetado para a fixação de tese vinculante pela Primeira Seção do STJ, no rito dos recursos repetitivos, o que levou à suspensão de todos os processos que discutiam pedidos de penhora da Fazenda contra empresas em recuperação judicial. Contudo, em junho de 2021, a afetação foi cancelada e as ações foram liberadas para trâmite, tendo em vista que a Lei n.º 14.112/2020 já havia solucionado a questão, na mesma linha do entendimento agora adotado pela Segunda Turma do STJ.
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REsp 2.184.895
Fonte: Conjur