Para que a distribuição desproporcional de lucros não seja qualificada como doação sujeita à tributação pelo Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), é essencial que esteja desvinculada de qualquer liberalidade e respaldada por uma justificativa negocial legítima.
Com esse entendimento, a 4ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) negou provimento ao recurso interposto por uma empresa familiar e manteve a exigência do ITCMD sobre a operação.
Os autos revelam que a sociedade limitada em questão tinha suas quotas majoritariamente detidas pelos pais (98%), enquanto seus dois filhos possuíam apenas 1% cada. Em 2017, a empresa distribuiu 90% dos lucros acumulados aos filhos, destinando apenas 10% aos pais, o que resultou em uma significativa redução do patrimônio líquido da companhia.
Meses após essa operação, os pais formalizaram a doação integral de suas quotas aos filhos, reservando para si o usufruto vitalício sobre os direitos patrimoniais e políticos da sociedade. Diante desse contexto, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo interpretou as transações como uma transmissão patrimonial gratuita e determinou a incidência do ITCMD.
No recurso, a empresa sustentou que a distribuição desproporcional estava expressamente prevista no contrato social e que os filhos exerciam atividades relevantes na sociedade, o que justificaria o recebimento de uma parcela majoritária dos lucros. Além disso, mencionou o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2.446 pelo Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a validade do planejamento tributário.
Em contraposição, a Secretaria da Fazenda argumentou que os filhos não detinham a condição de sócios-administradores, afastando, assim, qualquer justificativa econômica plausível para a referida distribuição.
Ao proferir seu voto, o relator, desembargador Paulo Barcellos Gatti, ressaltou que, embora houvesse previsão contratual para a distribuição desproporcional, não foi demonstrada uma motivação negocial idônea que afastasse a incidência do ITCMD. Também rejeitou o argumento de que os filhos exerciam funções administrativas na empresa, enfatizando que a remuneração por tais atividades deveria ocorrer por meio de pró-labore, sujeito à tributação pelo Imposto de Renda e às contribuições previdenciárias, o que não foi comprovado nos autos.
Diante da ausência de comprovação de propósito negocial legítimo, o TJ-SP manteve a exigibilidade do ITCMD sobre a operação.
Processo 1089011-58.2023.8.26.0053
Fonte: Conjur