TRF-2 confirma nulidade de sentença arbitral que condenava Petrobras a indenizar acionistas

29/05/2025

O Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) manteve a anulação de uma sentença arbitral que impunha à Petrobras o dever de indenizar os fundos de pensão Petros e Previ por perdas decorrentes da operação “lava jato”. A decisão da 5ª Turma Especializada do tribunal reconheceu que a União não poderia ter sido vinculada à convenção de arbitragem firmada pela estatal, uma vez que, à época da assembleia geral que aprovou tal cláusula, não havia respaldo legal para que o ente federativo aderisse a esse tipo de procedimento.

O entendimento majoritário foi de que o Estado não pode ser compelido a participar de arbitragem nem tampouco responsabilizado, por essa via, por atos praticados por administradores da companhia. Com isso, o TRF-2 afastou a pretensão dos acionistas e poupou os cofres públicos de um impacto estimado em R$ 166 bilhões — valor que ainda poderia ser acrescido de juros, correção monetária e honorários.

Os autores da arbitragem sustentavam que a União deveria compensar financeiramente a Petrobras pela perda de valor de mercado enfrentada durante a operação “lava jato”. Baseavam-se no artigo 58 do Estatuto Social da companhia, segundo o qual eventuais disputas entre a empresa, seus acionistas, administradores e conselheiros fiscais devem ser resolvidas por meio de arbitragem.

Em 2020, um tribunal arbitral da Câmara de Arbitragem do Mercado (CAM), da B3, acolheu a demanda e reconheceu a responsabilidade da estatal por supostamente ter veiculado informações falsas e incompletas ao mercado. No entanto, a 5ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro anulou a decisão, apontando vícios na instrução probatória.

Os acionistas recorreram ao TRF-2, alegando que a sentença judicial representava ingerência indevida no juízo arbitral. A Advocacia-Geral da União, por outro lado, sustentou que a União não estava submetida à cláusula compromissória por ausência de autorização legal à época de sua inclusão no estatuto da Petrobras (2002). Tal permissão geral somente veio a existir com a Lei nº 13.129/2015, que alterou a Lei de Arbitragem.

Além disso, a AGU destacou que a cláusula se restringe a litígios de natureza societária, e o objeto da arbitragem dizia respeito a atos de corrupção imputados a dirigentes da companhia — o que afasta a responsabilidade da União e descaracteriza qualquer vínculo jurídico direto com a controvérsia.

O relator do caso, desembargador Ricardo Perlingeiro, acolheu esses argumentos e enfatizou que a União, naquele contexto, não estava legalmente habilitada a aderir à arbitragem. Citou precedentes do Superior Tribunal de Justiça (CC 151.130) e do TRF da 3ª Região (AC 5024529-11.2020.4.03.6100) que confirmam a inaplicabilidade da arbitragem à União em situações similares.

Segundo o magistrado, a questão também esbarra na indisponibilidade do direito discutido, por envolver interesses públicos que não podem ser livremente transacionados ou submetidos à arbitragem, dada a reserva constitucional da jurisdição estatal em matérias sob monopólio da União (artigo 177 da Constituição).

Ele também lembrou que a Administração Pública está submetida aos princípios constitucionais, sobretudo ao da legalidade (art. 37, caput, da CF), o que impede que ela se submeta voluntariamente a compromissos não autorizados em lei.

A atuação da AGU foi conduzida pela Procuradoria Regional da União da 2ª Região, com apoio técnico do Núcleo Especializado em Arbitragem. O procurador regional Glaucio de Lima e Castro celebrou a relevância da decisão, que além de evitar prejuízo bilionário, fortalece os fundamentos da atuação pública e os limites legais da arbitragem em face do Estado.

Segundo o procurador, trata-se de um precedente jurisprudencial significativo:

“A decisão resguarda a União contra futuras tentativas de submetê-la a arbitragens indevidas, reafirma a soberania da jurisdição estatal e contribui para a segurança jurídica nas relações entre o setor público e privado.”


Processo 0230623-98.2017.4.02.5101

Fonte: Conjur

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